Olho por muito tempo pela janela do meu quarto. Já passa da meia-noite. Uma lua clara e fria brilha bem à minha frente, e o ar frio me refresca a pele de uma febre que não sabia possuir. Os pensamentos hoje não saíram da minha cabeça, ficaram todos trancados. Uma rotina chata e estressante me abateu. A noite veio e foi em meio a conversas virtuais, com amigos cada dia menos distantes, a cada dia mais queridos. A madrugada me pegou desperta e, por falta do que fazer, a caminho da cama. O voar da cortina que me levou à janela. A lua. O ar. À minha direita, um predio enorme com suas luzes eternamente acesas me chama a atenção. Quem dorme? Quem chora de saudades? Quantos arrumam as malas pensando na volta para casa? À minha esquerda, o resto da rua quase todo às escuras. Haverão outros como eu ali? Outros que, sob luzes indiretas, se recusam a chamar o sono? Abaixo da lua, as árvores começam novamente a ganhar suas folhas e eu sei que não demora agora a hora de o vento carregar suas diminutas flores até minha casa.
Dessa janela já vi muitas estações. Vi verões se transformarem em outono e invernos em primaveras. Nessa janela, chorei muitas mágoas e fiz pedidos mudos a divindades esquecidas. Nela, esfriei minha fronte febril e estiquei os braços para a tempestade. Nas madrugadas insones, fico olhando as casas e prédios que me cercam e tento contar as histórias que as paredes aprisionam. Invento dramas e comédias, rio ou choro sozinho da minha imaginação. Os carros passam. Velozes, barulhentos, velhos ou possantes, e eu imagino para onde vão. Só escuto sons. Não os vejo. Da minha janela, só janelas escuras e árvores me contemplam. Esses carros que passam, muitos deles carregam pessoas em busca de prazer, amor e aventura. Outros carregam tragédia, tristeza e dor. Tento contar a história deles também. Quando um escapamento estoura alegre, eu vejo amigos rindo e contando façanhas alcoolizadas. Uma freada mais brusca me diz que alguém está precisando de ajuda. Aprendi a ver, na noite, mais vida do que no dia. Da minha janela, a noite pulsa e exala um perfume que nunca será engarrafado. Hoje não uso um processador, nem martelo minhas teclas com ânsia. Hoje eu escrevo à velha moda. Caneta e papel. Surpreendo-me ao sair da janela e ir em busca desses apetrechos usados hoje em dia só para anotações descartáveis. Recosto-me à cama, cachorros aos pés, travesseiros às costas, janela escancarada. A casa range à minha volta se acomodando para seu sono. No quarto ao lado, minha mãe ressona na ignorância dos adormecidos. Caneta e bloco à mão, eu escrevo as primeiras palavras sem saber se conseguirei lê-las depois. A letra deformada pela semana de trabalho escolar feroz me inibe. Ajeito-me e começo. Agora, são três páginas do bloco e me sinto cada vez mais confortável. É tão pessoal, íntimo, ver minha mão correr com a caneta pelo papel que esqueço tudo o mais. A lua lá fora me abençoa e sorri ao me ver concentrado numa tarefa tão prosaica. Isso é bom e reconfortante. Saber que posso conter meus pensamentos para acompanhar a mão destreinada. Um princípio de desânimo me abate quando penso que amanhã ou depois vou ter que passar tudo para aquela máquina temperamental. Deixe estar. Afinal é tão bom escrever aqui, olhando da janela do meu quarto.
Dessa janela já vi muitas estações. Vi verões se transformarem em outono e invernos em primaveras. Nessa janela, chorei muitas mágoas e fiz pedidos mudos a divindades esquecidas. Nela, esfriei minha fronte febril e estiquei os braços para a tempestade. Nas madrugadas insones, fico olhando as casas e prédios que me cercam e tento contar as histórias que as paredes aprisionam. Invento dramas e comédias, rio ou choro sozinho da minha imaginação. Os carros passam. Velozes, barulhentos, velhos ou possantes, e eu imagino para onde vão. Só escuto sons. Não os vejo. Da minha janela, só janelas escuras e árvores me contemplam. Esses carros que passam, muitos deles carregam pessoas em busca de prazer, amor e aventura. Outros carregam tragédia, tristeza e dor. Tento contar a história deles também. Quando um escapamento estoura alegre, eu vejo amigos rindo e contando façanhas alcoolizadas. Uma freada mais brusca me diz que alguém está precisando de ajuda. Aprendi a ver, na noite, mais vida do que no dia. Da minha janela, a noite pulsa e exala um perfume que nunca será engarrafado. Hoje não uso um processador, nem martelo minhas teclas com ânsia. Hoje eu escrevo à velha moda. Caneta e papel. Surpreendo-me ao sair da janela e ir em busca desses apetrechos usados hoje em dia só para anotações descartáveis. Recosto-me à cama, cachorros aos pés, travesseiros às costas, janela escancarada. A casa range à minha volta se acomodando para seu sono. No quarto ao lado, minha mãe ressona na ignorância dos adormecidos. Caneta e bloco à mão, eu escrevo as primeiras palavras sem saber se conseguirei lê-las depois. A letra deformada pela semana de trabalho escolar feroz me inibe. Ajeito-me e começo. Agora, são três páginas do bloco e me sinto cada vez mais confortável. É tão pessoal, íntimo, ver minha mão correr com a caneta pelo papel que esqueço tudo o mais. A lua lá fora me abençoa e sorri ao me ver concentrado numa tarefa tão prosaica. Isso é bom e reconfortante. Saber que posso conter meus pensamentos para acompanhar a mão destreinada. Um princípio de desânimo me abate quando penso que amanhã ou depois vou ter que passar tudo para aquela máquina temperamental. Deixe estar. Afinal é tão bom escrever aqui, olhando da janela do meu quarto.